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A denunciação da lide pelo autor: possibilidade

Embora a redação dos incisos do artigo 70 do Código de Processo Civil dê margem ao entendimento de que a denunciação da lide somente tem cabimento quando requerida pelo réu, o artigo 71 do referido diploma legal evidencia ter lugar a denunciação da lide também pelo autor ao ditar que “a citação do denunciado será requerida, juntamente com a do réu, se o denunciante for o autor…”.

A viabilidade de a denunciação ser pleiteada pelo autor, outrossim, deriva do texto do artigo 74, segundo o qual, “feita a denunciação pelo autor, o denunciado, comparecendo, assumirá a posição de litisconsorte do denunciante e poderá aditar a petição inicial, procedendo-se em seguida à citação do réu”.

Conforme ensina Cassio Scarpinella Bueno, “a questão, que recebeu solução expressa no direito positivo brasileiro, ganha interesse porque, no direito estrangeiro, como se verifica do art. 325 do Código de Processo Civil de Portugal, o instituto do chamamento à autoria (que na sistemática do Código de Processo Civil brasileiro de 1973 foi denominado de denunciação da lide) só pode ser usado pelo réu”.

Justamente porque o direito brasileiro, tradicionalmente, admite a denunciação da lide tanto pelo réu como pelo autor é que Moacyr Amaral Santos define o instituto como “o ato pelo qual o autor ou o réu chama a juízo terceira pessoa que seja garante do seu direito, a fim de resguardá-lo no caso de ser vencido na demanda em que se encontram”.

José Manoel de Arruda Alvim Netto, a respeito do tema, converge a afirmar que “a posição do direito italiano e brasileiro se ajusta mais à necessidade da tutela jurídica conferida pelo Estado aos direitos dos particulares, permitindo, tanto ao autor, como ao réu, o chamamento de terceira pessoa ao processo”.

Observe-se, porém, que o autor e o réu podem ser denunciantes nas hipóteses previstas nos incisos I e III do artigo 70 do Código de Processo Civil; no caso do inciso II do aludido dispositivo de lei, somente o réu pode figurar como denunciante.

Tal assertiva decorre da própria redação do artigo 70, inciso II, o qual prevê ser obrigatória a denunciação da lide “ao proprietário ou ao possuidor indireto quando, por força de obrigação ou direito, em casos como o do usufrutuário, do credor pignoratício, do locatário, o réu, citado em nome próprio, exerça a posse direta da coisa demandada” (grifos nossos).

Exemplo usualmente referido pela doutrina para a denunciação a cargo do autor, como elucida Cassio Scarpinella Bueno, “é o da propositura da ação em que o autor pretende discutir a propriedade de bem adquirido de terceiro em face de outra pessoa”.

Nesse caso, com a improcedência da ação, desde que efetivada a denunciação, viável ao autor (denunciante) exercitar, desde logo, eventual direito de regresso em face do terceiro (alienante/denunciado).

A denunciação da lide, não obstante a natureza jurídica de ação, pode ser formalmente “ajuizada” na mesma petição inicial de que se vale o autor para demandar o réu.

Com efeito, não há nenhum dispositivo que imponha que a denunciação da lide seja manejada em arrazoado apartado da petição inicial.

Isto, contudo, não significa que a denunciação da lide não deva conter o mínimo indispensável a qualquer petição inicial.

O pedido deverá ser certo e determinado, indicando-se precisamente a causa de pedir da ação secundária para, com isto, viabilizar a defesa do denunciado, verdadeiro réu na ação de denunciação.

Bibliografia:

Cassio SCARPINELLA BUENO. Partes e terceiros no processo civil brasileiro. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2006.

José Manoel de ARRUDA ALVIM NETTO. Manual de direito processual civil. 7. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000.

Moacyr AMARAL SANTOS. Primeiras linhas de direito processual civil. vol. 2. 27. ed. São Paulo: Saraiva, 2010.