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A tributação de operações imobiliárias sob o novo IVA Dual

A Emenda Constitucional nº 132/2023 e a Lei Complementar nº 214/2025 inauguraram um marco na tributação sobre o consumo no Brasil, ao instituírem o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), formando o chamado modelo de IVA Dual. A substituição de tributos como ICMS, ISS, PIS, COFINS e IPI trouxe uma reconfiguração completa da forma de incidir tributos sobre bens e serviços, alcançando, pela primeira vez, de modo sistemático, as operações imobiliárias — segmento que até então se situava em zona de neutralidade tributária.

Ampliação do campo de incidência

A Lei Complementar nº 214/2025, ao regulamentar o novo sistema, incluiu expressamente as operações com bens imóveis — compra, venda, locação, permuta com torna e cessão onerosa de direitos reais — na base de incidência do IBS. A partir de 2026, tais operações passam a ser tratadas como fatos geradores de tributação sobre o consumo, com aplicação das regras de não cumulatividade e cobrança no destino. A locação de imóveis, que antes se submetia apenas ao Imposto de Renda e, em alguns casos, ao ISS sobre serviços acessórios, passa a integrar a moldura unificada do IVA Dual, incidindo IBS e CBS conforme regime específico definido pela lei complementar.

Pessoas jurídicas e pessoas físicas no novo regime

Empresas do setor imobiliário — incorporadoras, construtoras e holdings patrimoniais — estarão sujeitas ao IBS e à CBS sobre todas as operações onerosas de venda ou locação. A tributação incidirá sobre o valor efetivamente recebido, no regime de caixa, e permitirá crédito de insumos, serviços e bens utilizados nas atividades, em respeito à não cumulatividade. Mesmo empresas de outros setores que alienem ou loquem imóveis de forma esporádica serão alcançadas, ainda que em caráter eventual.


Para pessoas físicas, contudo, a sujeição ao novo regime dependerá da habitualidade e do porte econômico da operação. A lei definiu critérios objetivos: será considerado contribuinte aquele que, no ano anterior, possuir mais de três imóveis locados e receita anual superior a BRL 240 mil, ou aquele que, no ano corrente, ultrapassar BRL 288 mil de receita bruta em locações, ainda que com número menor de unidades. Também será enquadrado quem realizar mais de três vendas de imóveis em um mesmo exercício, ou duas vendas em menos de cinco anos de posse. Esses limites visam distinguir o investidor eventual do operador habitual, evitando a sobretributação do pequeno proprietário.

Alíquotas, redutores e tratamento setorial

O legislador buscou equilibrar a arrecadação com a preservação da atividade imobiliária, conferindo reduções significativas às alíquotas aplicáveis. Estima-se que a alíquota global do IVA Dual (soma de IBS e CBS) situar-se-á em torno de 28%. Entretanto, a LC nº 214/2025 fixou redutor de 50% para as operações de compra e venda de imóveis e de 70% para locações, o que resulta em carga efetiva aproximada de 14% e 8,4%, respectivamente. Nas locações residenciais, há ainda um redutor social de BRL 600,00 mensais por imóvel, atualizado pelo IPCA, de modo a aliviar o impacto sobre moradias populares.


Locações de curta duração — contratos de até 90 dias, inclusive via plataformas digitais como Airbnb — foram equiparadas aos serviços de hotelaria, aplicando-se redutor menor (40%) e alíquota efetiva em torno de 16,8%. A equiparação traz tratamento empresarial à locação por temporada, com repercussões diretas na precificação e no repasse do custo tributário ao consumidor final.

Regimes diferenciados e incentivos urbanos

A legislação também previu tratamento tributário favorecido para operações em áreas de reabilitação urbana, zonas históricas e regiões críticas de reconversão, permitindo reduções de até 60% nas alíquotas do IBS e da CBS — podendo chegar a 80% para locações em imóveis reabilitados. A concessão dos benefícios dependerá da aprovação prévia de projetos por Comissão Tripartite e da existência de plano municipal de desenvolvimento socioeconômico. A medida tem como objetivo estimular o aproveitamento do espaço urbano ocioso e fomentar políticas de habitação e preservação patrimonial.

Não cumulatividade e base de cálculo

A sistemática da não cumulatividade — prevista no art. 8º da LC nº 214/2025 e no art. 156-A, §§ 1º e 2º, da Constituição — assegura a compensação dos créditos decorrentes de aquisições vinculadas às atividades imobiliárias tributadas, evitando a incidência em cascata. A base de cálculo, por sua vez, corresponde à receita bruta auferida pelo contribuinte, considerada a contraprestação efetivamente recebida. O modelo privilegia a neutralidade fiscal e busca alinhar a tributação à capacidade contributiva real do sujeito passivo, especialmente em contratos de longo prazo.

Efeitos econômicos e estruturais

A nova incidência sobre operações imobiliárias tende a produzir impactos distintos conforme o perfil do contribuinte e a natureza da locação. No segmento empresarial (B2B), a possibilidade de creditamento reduz o custo efetivo e torna a tributação neutra na cadeia. Já nas locações residenciais, em que o consumidor final não se credita, há tendência de repasse do tributo aos preços, pressionando o mercado de aluguel até novo ponto de equilíbrio. Além disso, a inclusão de pessoas físicas habituais no campo do IBS e da CBS exige reorganização patrimonial e fiscal, podendo estimular o uso de holdings imobiliárias e o redirecionamento de investimentos para Fundos de Investimento Imobiliário (FIIs), que permanecem fora do escopo do IVA Dual em relação aos aluguéis recebidos diretamente pelo fundo.

Desafios de implementação e adaptação do mercado

O novo sistema requer ajustes significativos em governança fiscal, apuração e documentação. A apuração mensal pelo regime de caixa, a identificação da habitualidade e a emissão de documento fiscal pelas pessoas físicas contribuirão para um cenário de maior formalização, mas também de maior complexidade operacional. Para contratos em vigor, será necessária revisão de cláusulas de repasse, covenants e fluxos de pagamento, sobretudo em empreendimentos de locação comercial e de curta duração.


Embora a reforma busque simplificação e transparência, sua eficácia dependerá da harmonização interpretativa entre União, estados e municípios, e da clareza nas regulamentações complementares. O equilíbrio entre arrecadação, justiça fiscal e funcionalidade econômica será o verdadeiro teste de maturidade do novo modelo.

Este texto foi desenvolvido com o apoio de uma ferramenta de inteligência artificial.

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