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Aplicabilidade do Prazo em Dobro em Processos Eletrônicos

Com implantação dos processos eletrônicos nos Tribunais Pátrios, apesar dos inúmeros benefícios alcançados, muitas dúvidas operacionais e administrativas surgiram, principalmente, quanto ao manuseio desta ferramenta, já que não há uma uniformização nos sistemas adotados.

Se isso não bastasse, algumas normas processuais já estão sendo interpretadas em consonância com as praticidades do processo digital, muito embora não tenham sido idealizadas nesse novo contexto.

Analisando essa nova realidade digital, situação que merece o máximo de cautela é a aplicação da regra prevista no artigo 191 do Código de Processo Civil nos processos eletrônicos.

Referido dispositivo prevê que “quando os litisconsortes tiverem diferentes procuradores, ser-lhe-ão contados em dobro os prazos para contestar, para recorrer e, de modo geral, para falar nos autos”.

É cediço que o acesso aos autos em cartório ou, ainda, fora dele, nem sempre é possível, ainda mais se tratando de processos com pluralidade de partes com procuradores diferentes.

Por essa razão, a ideia do legislador foi claramente permitir a manifestação das partes em casos de pluralidade de Autores e/ou Réus, desde que representados por procuradores distintos, em tempo suficiente e adequado, evitando, assim, violação aos princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa.

No entanto, em processos que tramitam no sistema eletrônico, o que era um entendimento isolado do Tribunal Regional Federal da 4º Região, passou recentemente a ser adotado pela 30ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, cujo posicionamento é que a finalidade da regra prevista no citado diploma processual tem aplicabilidade apenas em processos físicos, os quais, sem nenhuma dúvida, o acesso requer tempo.

Para corroborar tal afirmação, seguem os precedentes jurisprudenciais:

“EMENTA: Ação de obrigação de fazer Decisão que indeferiu o pedido da agravante no tocante à contagem de prazo em dobro, nos termos do art. 191 do CPC e decretou sua revelia Parcial reforma Necessidade Processo eletrônico Protocolo, distribuição e juntada de petições eletrônicas que poderão ser feitos automaticamente, sem intervenção da unidade judiciária – Resolução nº 551/2011 do TJSP – Magistrado do processo que determinou o aditamento do mandado para citação da agravante – Prazo para apresentação da contestação que deve ter início no dia subsequente ao da certidão eletrônica que informou a juntada/devolução do mandado Aplicação do art. 191 do CPC – Desnecessidade – Processo eletrônico Conteúdo à disposição das partes 24 horas por dia Precedentes jurisprudenciais do TRF. (TJSP. 30ª Câmara de Direito Privado. Agravo de Instrumento nº 084668-50.2013.8.26.0000/SP. Rel. Des. Marcos Ramos)

“EMENTA: ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. PRAZO EM DOBRO. ART. 191 DO CPC. LITISCONSÓRCIO COM DIVERSIDADE DE PROCURADORES. PROCESSO ELETRÔNICO. DESNECESSIDADE. O artigo 191 deve ser interpretado de forma teleológica, isto é, de forma a atender à finalidade da norma, respeitando os princípios da utilidade, igualdade e da ampla defesa. Assim, a regra contida no art. 191 do CPC é inaplicável ao processo eletrônico, posto que não se fazem mais presentes as restrições para vista dos autos. (TRF 4ª Região – Agravo de Instrumento nº 5003563-11.2013.404.0000/PR Rel. Des. Fed. FERNANDO QUADROS DA SILVA j. 15 de maio de 2013)

O fundamento dessas decisões é que o acesso ao processo eletrônico pelas partes e pelos procuradores é irrestrito e simultâneo, o que afasta completamente a finalidade interpretativa da norma, sem, contudo, afrontar os princípios constitucionais da ampla defesa e do contraditório, da igualdade entre as partes, da segurança jurídica e do devido processo legal.

Por outro lado, posições contrárias defendem que, além dos princípios constitucionais supramencionados, o próprio dispositivo processual é violado, já que não lhe cabe nenhum tipo de interpretação teológica.

Até porque a redação do artigo 191 do Código de Processo Civil é clara, sendo que qualquer interpretação diversa submete advogados e partes a uma situação de insegurança jurídica processual.

Além disso, o que se argumenta é que a norma processual não foi revogada, nem alterada pela Lei nº 11.419, de 19 de dezembro de 2006, que dispõe sobre a informatização do processo judicial.

Ao ensejo, oportuno ressaltar que o projeto do Novo Código de Processo Civil não altera a regra do prazo em dobro.

Nessa linha, assim já decidiu o Tribunal Regional Federal da 2º Região:

“O escopo do dispositivo [art. 191] é o de garantir a ampla defesa e o contraditório, mormente porque, sendo o prazo comum, de regra, os procuradores só teriam vista dos autos em cartório, podendo retirá-los somente após prévio ajuste e por petição, como previsto no § 2º, do art. 40, do CPC. II. A despeito de não se vislumbrar prejuízo aos litisconsortes, mormente porque, no processo eletrônico, os procuradores teriam simultaneamente disponível a integralidade das peças dos autos, devem às partes ser conferido prazo em dobro, vez que a Lei nº 11.419, de 19 de dezembro 2006, que dispôs sobre a informatização do processo judicial, não revogara ou afastara a incidência do art. 191, do CPC, tampouco criara qualquer exceção à aplicação deste dispositivo no processo eletrônico” (cf. AI 0015332-92.2012.4.02.0000, Rel. Des. Sergio Schwaitzer; DEJF 06/12/2012, p. 431).

Importante ressaltar que a controvérsia existente acerca do referido dispositivo de lei federal não foi apreciada pelo Superior Tribunal de Justiça, o que certamente ainda causará dúvidas, debates e eventuais prejuízos.

Enquanto não há um pronunciamento do Superior Tribunal de Justiça ou, ainda, uma mudança legislativa, por cautela recomenda-se que a aplicabilidade da norma do artigo 191 do Código de Processo Civil em processos que tramitam pelo sistema eletrônico seja evitada, assim evitando prejuízos.