S1kip to content

Da licitude do sistema “credit scoring”: recente entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça

No último dia 12 de novembro, a Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça examinou, em sede recurso especial representativo de controvérsia (artigo 543-C do Código de Processo Civil), a natureza do sistema “credit scoring” e a possibilidade – oriunda de sua utilização – de violação a princípios e regras do Código de Defesa do Consumidor.

O chamado “credit scoring”, ou simplesmente “credscore”, é uma metodologia de pontuação de risco de concessão de crédito a determinado consumidor.

Trata-se de um método desenvolvido a partir de modelos estatísticos para avaliação do risco de concessão de crédito, com atribuição de uma nota ao consumidor avaliado conforme a natureza da operação a ser realizada.

Aproveitando-se da facilidade contemporânea de acesso as bancos de dados disponíveis no mercado via “internet”, algumas empresas desenvolveram fórmulas matemáticas para avaliação do risco de crédito, considerando diversas “variáveis de decisão”.

As aludidas “variáveis de decisão” são fatores que a experiência empresarial denotou como relevantes para avaliação do risco de retorno do crédito concedido.

Cada uma dessas variáveis recebe uma determinada pontuação, atribuída a partir de cálculos estatísticos, formando a nota final.

Consideram-se, para tanto, informações acerca do adimplemento das obrigações (histórico de crédito), assim como dados pessoais do consumidor avaliado (idade, sexo, estado civil, profissão, renda, número de dependentes, endereço etc.).

Os cadastros de devedores e os bancos de dados de proteção ao crédito, como modalidades de arquivos de consumo, foram devidamente regulamentados pelo artigo 43 do Código de Defesa do Consumidor.

Posteriormente, através da Lei nº 12.414/2011, estatuíram-se normas voltadas à “disciplina e consulta bancos de dados com informações de adimplemento, de pessoas naturais ou de pessoas jurídicas, para a formação de histórico de crédito” (Lei do Cadastro Positivo).

Dado o notório desconhecimento da sociedade civil acerca do tema – sem olvidar sua relevância -, o Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, relator do recurso especial representativo da controvérsia, convocou audiência pública para analisar os argumentos em prol e em detrimento do sistema “credit scoring”.

Referida audiência foi realizada no dia 25 de agosto de 2014, contando com a participação de diversos segmentos da sociedade.

Foram habilitadas 21 pessoas físicas e jurídicas para fazer exposições, entre elas representantes da Ordem dos Advogados do Brasil, do Ministério Público, da Confederação Nacional dos Dirigentes Lojistas, da Federação Brasileira de Bancos e de inúmeras entidades de defesa dos direitos dos consumidores.

As apresentações foram divididas em quatro painéis, com expositores a favor e contra o sistema “scoring”.

Para aqueles que se manifestaram contra o sistema, a falta de transparência e clareza da ferramenta é o maior problema atual desse modelo de avaliação de crédito.

Por sua vez, os defensores do método de pontuação sustentaram basicamente que avaliar de modo seguro a qualidade do tomador é uma forma de tornar o crédito mais barato, sobretudo nas modalidades mais populares, como o crédito direto por meio de carnês ou cheques pré-datados.

No julgamento, a Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça, à unanimidade de votos, consagrou a licitude do sistema “credit scoring”, desde que observados os limites estabelecidos pelo sistema de proteção ao consumidor.

A Corte, no caso concreto, proveu parcialmente o recurso especial selecionado e reformou o acórdão recorrido para afastar a indenização por danos morais arbitrada em decorrência da utilização do sistema “credit scoring”.

Assim, a teor do artigo 543-C do Código de Processo Civil, foram firmadas as seguintes teses:

“1) O sistema “credit scoring” é um método desenvolvido para avaliação do risco de concessão de crédito, a partir de modelos estatísticos, considerando diversas variáveis, com atribuição de uma pontuação ao consumidor avaliado (nota do risco de crédito).

2) Essa prática comercial é lícita, estando autorizada pelo art. 5º, IV, e pelo art. 7º, I, da Lei n. 12.414/2011 (lei do cadastro positivo).

3) Na avalição do risco de crédito, devem ser respeitados os limites estabelecidos pelo sistema de proteção do consumidor no sentido da tutela da privacidade e da máxima transparência nas relações negociais, conforme previsão do CDC e da Lei n. 12.414/2011.

4) Apesar de desnecessário o consentimento do consumidor consultado, devem ser a ele fornecidos esclarecimentos, caso solicitados, acerca das fontes dos dados considerados (histórico de crédito), bem com as informações pessoais valoradas.

5) O desrespeito aos limites legais na utilização do sistema “credit scoring”, configurando abuso no exercício desse direito (art. 187 do CC), pode ensejar a responsabilidade objetiva e solidária do fornecedor do serviço, do responsável pelo banco de dados, da fonte e do consulente (art. 16 da Lei n. 12.414/2011) pela ocorrência de danos morais nas hipóteses de utilização de informações excessivas ou sensíveis (art. 3º, §3º, I e II, da Lei n. 12.414/2011), bem como nos

casos de comprovada recusa indevida de crédito pelo uso de dados incorretos ou desatualizados.” (STJ-2ª Seção, REsp nº 1.419.697 – RS, rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, j. 12.11.2014, DJe 17.11.2014)

No comments yet

Leave a Reply

You may use basic HTML in your comments. Your email address will not be published.

Subscribe to this comment feed via RSS